Era uma
vez um príncipe feliz que vivia em um castelo de pedra encravado no alto de uma
montanha e tão alto que as nuvens entravam e saíam pelas janelas desse castelo.
Ao seu lado vivia a princesa Miranda, sua prima, com quem em breve ele se
casaria. Não só os noivos, mas também todos os habitantes do reino esperavam
com ansiedade o dia do casamento. Antes da cerimônia, porém, o príncipe Rodrigo
deveria viajar até as fronteiras do reino onde havia um bosque sagrado e,
segundo a lenda, um cristal encantado que ornava a coroa real em tempos míticos
e que fora perdido pelos seus antepassados.
Em volta do castelo o reino se dividia em oito povoados e todos queriam que o
príncipe cruzasse suas ruas no dia da viagem. As aldeias distinguiam-se pela
cor de seus habitantes, da bandeira e das roupas, pela cor das paredes e dos
telhados de suas casas. Havia o povo azul, o povo verde, o violeta, amarelo,
laranja, vermelho, lilás e o povo negro que vivia em um vale escuro onde o sol
nunca brilhava. Todos eles teciam um manto para Rodrigo usar neste dia e
acreditavam que o manto mais vistoso, de cor mais esplêndida e encarnada,
decidiria o percurso do monarca. O príncipe, na véspera da viagem e a poucos
dias do casamento, não sabia o que fazer e resolveu convocar as fadas de cada
povoado para um concílio encantado. No grande salão do castelo, a fada azul, a
amarela, a verde... Todas elas, parciais e caprichosas, tentavam convencer o
monarca a trilhar o caminho de suas aldeias apelando ao simbolismo das cores e
às virtudes secretas que elas encarnavam. Mas seus argumentos pareciam retumbar
no brasão da justiça sobre as armas pendurado, não chegando assim aos ouvidos
reais. Decidiram então, as fadas, por um astucioso passe de mágica: todas se
deram as mãos formando um círculo e Rodrigo, no meio, se multiplicou em oito
príncipes iguais, idênticos em tudo, exceto na cor da pele e cada réplica de
Rodrigo vestiu o manto com a cor de um povoado. Combinado ficou que as fadas
ficariam de mãos dadas (caso contrário o encanto se quebrava) até o retomo do
príncipe que sofria se ficasse um instante sequer longe da sua amada.
Os oito príncipes saíram do castelo por oito portas diferentes; por oito
caminhos que cruzavam o reino que, visto de cima cercado de povoados de cores
distintas, parecia a paleta de um aquarelista atarefado. O príncipe azul usava
um excelso manto azul-marinho, outro trazia violetas no cabelo e um outro, todo
vestido de ouro, arrancava aplausos no povoado dos homens amarelos. No castelo
a princesa Miranda sentia o seu amor multiplicado derramando-se para o universo
e as fadas, de mãos dadas, vibravam com a alegria que seus protegidos
experimentavam. Um imprevisto, contudo, viera ferir a suscetibilidade de uma
das fadas. O príncipe negro, usando uma retinta libré cor da noite sem
estrelas, cavalgava um negro corcel e parecia uma mancha, uma sombra móvel e
confusa na escuridão da floresta. Ele desfilou lenta e reverente pelo vale
sombrio, pelas ruas da aldeia negra, sob as árvores da encosta que filtravam a
mais intrépida réstia de luz. NINGUÉM VIU O PRÍNCIPE NEGRO PASSAR! Os
habitantes, na soleira das portas, teciam injúrias e maldições que soavam como
silvos de serpentes e pio de aves agourentas. A fada negra esperou o dia
inteiro e não sentiu os mágicos arrepios da alegria que suas companheiras
experimentaram e concluiu que seu povo fora enganado. No exato momento em que
os oito príncipes erravam pelo bosque em busca do cristal encantado, ela
retirou suas mãos do círculo mágico e o encanto se desfez. A princesa deu um
grito de dor e o príncipe negro dissolveu-se em fumaça envolvendo todo o bosque
com a mais espessa e retinta escuridão. Perdidos na floresta, os sete príncipes
coloridos nunca mais puderam se reunir na pele do príncipe Rodrigo. Diz a lenda
que em dias de chuva, quando a água lava a fuligem do bosque, as sete réplicas
de Rodrigo formam um raio de luz, um arco-íris que desliza pelas nuvens, cruza
a extensão do céu e, pela janela do castelo, vem beijar os lábios da princesa
abandonada!
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