Perde-se
no tempo a origem desse sonho já quase realizado: máquinas que pensam. Um
de seus mais alpinos mentores foi o teólogo catalão do século treze, Raimundo
Lullio. Sua Ars Magna era uma verdadeira máquina, não apenas teórica, mas uma
máquina de pensar, que foi implementada, construída e posta a prova na prática
e propunha um método de formular enunciados a partir das combinações de
conceitos identificados por letras inscritas ao longo de círculos concêntricos
giratórios. O mecanismo luliano tem sido considerado, por historiadores da
ciência, como a primeira máquina de pensar ou de enunciar sentenças, formadas
radialmente através da leitura de letras em movimento potencial ao redor de um
centro. Mais tarde, inspirado na calculadora de Blaise Pascal, Leibniz – que
inclusive inventou uma calculadora melhor capaz de realizar as quatro operações
– criou uma nova Lógica, a Mathesis Universalis. Pretendia ela ser um
“alfabeto” do pensamento, capaz de gerar mecanicamente qualquer idéia a partir
de qualquer outra (era a aurora das ciências mecânicas, onde relojoeiros e
artesãos deslumbravam as cortes com realejos, jogadores autômatos, caixinhas de
música e outros mimos de ourivesaria e melindres). Finalmente, no Século vinte,
Alan Touring aplicou a lógica matemática a um sistema de comutação elétrica e
criou finalmente o protótipo do computador. O resto é historia! Gosto de pensar
nas rudimentares tábuas, e seus conceitos teologais nelas inscritos, com as
quais o Raimundo Lúllio viajou pelo mundo islâmico tentando explicar a teologia
cristã aos árabes usando sua “máquina”. (Há um primoroso texto de Borges sobre
esse tema no livro “Textos Cativos”). Além desse caminho lógico e matemático
que descambou nos gadjets modernos, essa Ars Magna do Lullio poderia ter
servido para outros usos, estéticos e científicos, pois que nossos modos de
pensar são mediatamente infinitos, como pensava Espinosa, outro apaixonado
pelos rigores geométricos da época. Criei alguns exemplos jocosos de
pensamentos parafusados para ilustrar estas novas possibilidades:
“O
lobo é um cão com alma de gato”. Pode-se girar em sentido horário os termos
dessa proposição e conseguir novas definições: “o cão é um gato com alma de
lobo” e “o gato é um lobo com alma de cão”. Outro exemplo mais etéreo, que
exige as pastilhas da memória e dos folguedos da infância, seria:
“O
mar é uma piscina de rio; A piscina é um rio de mar; o rio é um mar de
piscina!”
Também
é possível tracionar o eixo saltando dois ou três dentes da catarineta, tipo:
“O
cão é o melhor amigo do homem. O homem é o lobo do homem. O cão é amigo do lobo
do homem. O cão é lobo”.
Agora
é a sua vez. Tente alguma coisa, desenrosque a biela, cole o relê, chame nas
catracas e escreva algo. Enquanto isso, vou ali ver se, cruzando uma rolinha
com um pepino, consigo um ninho de azeitonas!
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