Heráclito dizia que a natureza ama se esconder (physis kriptestai philei, se não me falha meu velho grego de seminário); mas ela também gosta de se revelar, às vezes, de um exibicionismo cavalar. Estava eu procurando não sei o quê, em uma loja de departamentos, quando tive uma reminiscência, uma destas memórias involuntárias, e me vi transportado para uma tarde de verão na praia, há muitos anos atrás. Senti a brisa marinha, ouvi o quebrar das ondas nas pedras e vi os remos de um barco se derreter no lisérgico das águas... Busquei a causa dessa recordação, pois, como dizia o velho Ari (Aristóteles), para tudo que existe, existe uma causa. Ao meu lado, uma senhora havia destampado um tubo de Noskote, um protetor solar de aroma adocicado, com o qual minha mãe me lambuzava quando eu ia me esfalfar nas longas tardes de verão na praia. Ali estava, aos olhos da mente, um pedaço inteiro da natureza desfraldado; porém, pensando melhor, se considerarmos que era somente a mim, na azáfama daquela loja, que ela se revelava e, considerando também o fato de quão estúpido é acreditar que o cérebro seja uma gaveta de imagens, que tão vasta paisagem possa estar localizada em algum lugar em nossos gordurosos miolos, devo concluir que toda a tarde de verão na praia estava guardado no pequeno tubo de Noskote, e que Heráclito estava certo em afirmar o quanto a natureza é mascarada!
TEXTOS EMPOLGADOS AO COMPARTILHAR PUNGENTES OLDIES:
a) Tantas foram as súplicas, que o DJ voltou!!! Essa balada lhe transportará para o fim dos 70’s, para uma noite de domingo, em um parque de diversões. Tu andarás sobre a relva, entre carrinhos de pipoca e de algodão-doce. A brisa do verão te levará o olor fugaz dos corpos suados. Debruçado sobre um balcão, laçando maços de cigarros em um jogo de argolas, tu me encontrarás com o rosto cheio de penugens e promessas de felicidade: é que Gísala, aquela "galegarrumada", empregada do prefeito - e que hora gira ao luar sorrindo pernas e cabelos no carrossel do amor - marcou comigo às onze e meia, atrás do muro da igreja. A agulha da vitrola castigava essa canção envolvendo o parque das minhas reminiscências com uma espécie de suspense erotômano: fora no embalo dessa canção que eu perdi a minha virgindade! Aumentem o som e sintam a estereofonia da carne profunda granular em seus ouvidos!
b) O Valor de um historiador se mede pela profundidade dos seus mergulhos no oceano do passado, quando, muitas vezes, com os olhos injetados de um cachalote, retorna á superfície, trazendo um pérola iridescente nas mãos. Essa eu fui buscar no fundo dos anos setenta: É DE LASCAR O CABO DA MANIVELA, GOBIRA! Mas os olhos injetados que ostento não se devem à pesquisa e sim aos sentimentos oceânicos que tal canção faz brotar no meu coração comovido. Tão avassaladores que não consigo descrever. Se me perguntarem: “tem algo a ver com a galega?”, responderei SIM! Tudo tem a ver com a minha galega morta de uma facada no meio da feira! Oh! Finjo a felicidade que a sociedade me exige, mas não sou feliz, pois invejo o meu passado!
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