Lendo a obra do Cientista Stephen La berge, da universidade de Palo Alto, Pasadena-Ca. Ele fala-nos da freqüência insuspeitada de sonhos lúcidos, aqueles em que sabemos que estamos sonhando.
Apesar de a psicologia conservadora duvidar que seja possível sonhar se sabendo sonhando, ele prova a ocorrência desse fenômeno com uma série de experimentos irrefutáveis. Ocorreu-me, a fortiori, ter um destes sonhos lúcidos no período da leitura. Sonhei que andava por frias avenidas de São Paulo e vi passar na calçada o meu pai. Seu braço direito estava sem a mão. Assustei-me e, ao voltar a vê-lo por entre transeuntes apressados, ele estava de novo com sua mão amputada na extremidade do braço. Achei aquilo muito estranho e pensei comigo: “caramba! Assim que acordar, vou pesquisar o que significa sonhar com o pai de mão amputada!”. Assim pensando, entrei em um elevador e me perdi nas lambanças imprevisíveis dos sonhos e da modorra. Agora que escrevo isso, perdida a vivacidade do episódio sonhado, estou em dúvidas, sem saber se tive mesmo um sonho lúcido, com a etérea consciência de estar sonhando, ou se, influenciado pela leitura vesperal, tive uma “recordação cognitiva”, me lembrando de algo lido e, com a liberalidade peculiar dos sonhos, aplicando a ideia recordada ao evento sonhado sem saber mesmo que sonhando estava. Mais melindrosa, cabeluda e cavilosa, essa segunda hipótese tem mais a ver comigo. Quem me conhece, sabe o que estou falando!
Para encerrar esse apontamento, talvez o caso mais famoso de sonho lúcido tenha sido o do químico August Kekulé, no final do século dezenove. Ele e seus colegas pesquisavam arduamente qual seria a forma espacial da molécula de benzeno. Ninguém fazia a menor ideia de como seus átomos se arranjariam no espaço. Kekulé sonhou uma noite com um ouroboros (que, aliás, ele conta nunca antes ter sabido da existência desse símbolo), uma cobra devorando o próprio rabo e formando assim um círculo. No sonho, ele conta ter pensado: “Um anel! Quando acordar vou investigar, mas tenho certeza de que a molécula do benzeno tem a forma anelar!”. Acertou em cheio! Serão eminentemente proféticos os sonhos lúcidos? Será que meu pai, feito uma mítica serpente, estava comendo a própria mão? E com isso me dizendo de forma alegórica que SIM, que eu estava sonhando e sabendo que sonhava em um círculo sem fim (sei que estou sonhando e sonho que sei que estou a sonhar sabendo que sonho...)? Há! Maldita geleia estragada que devorei antes de dormir!...
* * *
...Sonhei tresantontem que havia recebido um prêmio Literário. Fiquei tão eufórico com o prêmio que atravessei a rua distraído, comemorando e indo contar para alguém (que agora não me lembro quem). Um Ônibus veio alucinado em minha direção e me atropelou. Eu não saí do lugar. O Ônibus começou a atravessar o meu corpo - ou eu a atravessá-lo. Senti as ferragens, o piso metálico, o motorista passar por mim, em pânico, tentando frear. Os passageiros vinham velozes em minha direção e atravessavam meu corpo, fígado contra fígado, coração contra coração, inúteis mãos no rosto se entrelaçando nas minhas para logo dar lugar ao estofo puído de napa das poltronas (de péssimo gosto quando atravessavam meus lábios). Passei fedendo pelo motor traseiro, conhecendo de dentro o que é uma biela, um carburador, uma junta homocinética, sentindo a alma de um platinado gasto e o truculento espírito que anima uma caixa de marchas! Do ônibus fantasma só me restou um zumbido a se perder na distância, enquanto a rua do sonho voltava a ser a mesma rua de antes - ou quase, pois no sonho tudo se mexe - e do outro lado havia alguém me esperando sem nenhuma surpresa. O prêmio havia feito de mim um imortal, pensei na hora; só espero que não tenha sido um convite para ocupar a cadeira do Sarney na Academia Brasileira de letras! Aí já não seria um sonho, ou sequer um pesadelo. Aí já seria sacanagem!
P.S. Já sonhei sendo o lado interno de uma esfera a rolar por ruas azafamadas, de onde só se ouvia o ruído e o pânico.... Já tive um sonho duplo, isto é, dois sonhos completamente distintos ao mesmo tempo, e agora, esse! Acordado sou um homem extremamente normal. Até mesmo pachorrento. Mas dormindo, sou um dos homens mais singulares do Brasil!
Apesar de a psicologia conservadora duvidar que seja possível sonhar se sabendo sonhando, ele prova a ocorrência desse fenômeno com uma série de experimentos irrefutáveis. Ocorreu-me, a fortiori, ter um destes sonhos lúcidos no período da leitura. Sonhei que andava por frias avenidas de São Paulo e vi passar na calçada o meu pai. Seu braço direito estava sem a mão. Assustei-me e, ao voltar a vê-lo por entre transeuntes apressados, ele estava de novo com sua mão amputada na extremidade do braço. Achei aquilo muito estranho e pensei comigo: “caramba! Assim que acordar, vou pesquisar o que significa sonhar com o pai de mão amputada!”. Assim pensando, entrei em um elevador e me perdi nas lambanças imprevisíveis dos sonhos e da modorra. Agora que escrevo isso, perdida a vivacidade do episódio sonhado, estou em dúvidas, sem saber se tive mesmo um sonho lúcido, com a etérea consciência de estar sonhando, ou se, influenciado pela leitura vesperal, tive uma “recordação cognitiva”, me lembrando de algo lido e, com a liberalidade peculiar dos sonhos, aplicando a ideia recordada ao evento sonhado sem saber mesmo que sonhando estava. Mais melindrosa, cabeluda e cavilosa, essa segunda hipótese tem mais a ver comigo. Quem me conhece, sabe o que estou falando!
Para encerrar esse apontamento, talvez o caso mais famoso de sonho lúcido tenha sido o do químico August Kekulé, no final do século dezenove. Ele e seus colegas pesquisavam arduamente qual seria a forma espacial da molécula de benzeno. Ninguém fazia a menor ideia de como seus átomos se arranjariam no espaço. Kekulé sonhou uma noite com um ouroboros (que, aliás, ele conta nunca antes ter sabido da existência desse símbolo), uma cobra devorando o próprio rabo e formando assim um círculo. No sonho, ele conta ter pensado: “Um anel! Quando acordar vou investigar, mas tenho certeza de que a molécula do benzeno tem a forma anelar!”. Acertou em cheio! Serão eminentemente proféticos os sonhos lúcidos? Será que meu pai, feito uma mítica serpente, estava comendo a própria mão? E com isso me dizendo de forma alegórica que SIM, que eu estava sonhando e sabendo que sonhava em um círculo sem fim (sei que estou sonhando e sonho que sei que estou a sonhar sabendo que sonho...)? Há! Maldita geleia estragada que devorei antes de dormir!...
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...Sonhei tresantontem que havia recebido um prêmio Literário. Fiquei tão eufórico com o prêmio que atravessei a rua distraído, comemorando e indo contar para alguém (que agora não me lembro quem). Um Ônibus veio alucinado em minha direção e me atropelou. Eu não saí do lugar. O Ônibus começou a atravessar o meu corpo - ou eu a atravessá-lo. Senti as ferragens, o piso metálico, o motorista passar por mim, em pânico, tentando frear. Os passageiros vinham velozes em minha direção e atravessavam meu corpo, fígado contra fígado, coração contra coração, inúteis mãos no rosto se entrelaçando nas minhas para logo dar lugar ao estofo puído de napa das poltronas (de péssimo gosto quando atravessavam meus lábios). Passei fedendo pelo motor traseiro, conhecendo de dentro o que é uma biela, um carburador, uma junta homocinética, sentindo a alma de um platinado gasto e o truculento espírito que anima uma caixa de marchas! Do ônibus fantasma só me restou um zumbido a se perder na distância, enquanto a rua do sonho voltava a ser a mesma rua de antes - ou quase, pois no sonho tudo se mexe - e do outro lado havia alguém me esperando sem nenhuma surpresa. O prêmio havia feito de mim um imortal, pensei na hora; só espero que não tenha sido um convite para ocupar a cadeira do Sarney na Academia Brasileira de letras! Aí já não seria um sonho, ou sequer um pesadelo. Aí já seria sacanagem!
P.S. Já sonhei sendo o lado interno de uma esfera a rolar por ruas azafamadas, de onde só se ouvia o ruído e o pânico.... Já tive um sonho duplo, isto é, dois sonhos completamente distintos ao mesmo tempo, e agora, esse! Acordado sou um homem extremamente normal. Até mesmo pachorrento. Mas dormindo, sou um dos homens mais singulares do Brasil!
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